quarta-feira, 14 de março de 2012

Doce cigarro: liberdade ou saúde?


Ontem a Anvisa proibiu a venda de cigarros com sabor no Brasil. Muita gente está esbravejando, dizendo que o Estado não tem direito de se intrometer nas escolhas e na vida das pessoas, etc. 

Entendo esse pessoal. De fato, dizer o que é bom e o que é ruim para a própria pessoa cabe só a ela, não sendo uma tarefa de entes estatais. Estes precisam, sim, informar as pessoas a respeito das conseqüências que seus atos podem ter, inclusive adotando medidas para desestimular certos comportamentos prejudiciais e incentivar atitudes desejáveis, mas não devem dizer o que é bom e o que não é.

Proibir, pura e simplesmente, acho que não é sempre o melhor caminho. Na verdade, considero que drogas leves, como a maconha ou LSD, deveriam ser lícitas, tanto para evitar o tráfico e a criminalidade dele conseqüente, quanto para gerar receitas com tributos, criar empregos diretos e indiretos, etc. Mas a discussão sobre a legalização não se confunde com a questão dos cigarros com sabor, que envolve o problema ético de atrair jovens, sempre mais vulneráveis, para o consumo desse tipo de substância.

Entendo que a luta contra o cigarro não é só uma questão de direito e liberdade meramente individuais (desconsiderando-se, é claro, a questão dos fumantes passivos). Trata-se de um problema sério de saúde pública e de políticas públicas em geral. Senão vejamos.

A incidência de câncer nos fumantes é incomparavelmente maior do que nos abstêmios. E quando as doenças começam a aparecer quem é que paga a conta? A maioria dos doentes vai para o SUS, havendo gasto direto de todos os cidadãos contribuintes com aquele tratamento. E mesmo que o paciente vá para um hospital particular, ele se abstém do trabalho, deixando de produzir riqueza, e, no meio tempo, é sustentado pela Previdência Social, cujos recursos advém de todos os trabalhadores, empregadores privados e do Estado. Se a pessoa morre, como infelizmente não é incomum, o problema deixa de ser temporário, perpetuando-se nas pensões por morte.

No fim, o debate todo diz respeito à boa e velha ponderação de valores. De um lado, a liberdade individual de fumar (no caso, o cigarro com sabor). Do outro, o dinheiro público que poderia muito melhor ser aproveitado na execução de políticas públicas voltadas para outras áreas, como educação, segurança, saneamento, trabalho e emprego, a própria saúde, etc.

Por isso, não acho tão absurda a decisão da Anvisa de vedar a comercialização desses cigarros, que são o chamariz do marketing para capturar os jovens e torná-los, a longo prazo, consumidores fiéis, viciados e doentes. Até ontem, era um bom investimento para a indústria do fumo, e seu retorno certo se dava nas filas dos hospitais e do INSS, sentidas sempre apenas pela "gente diferenciada".

Para finalizar, o que mais espanta é ver que os mesmos jovens que não sabem nem do que se tratam os problemas de Pinheirinho, Belo Monte, Crackolândia, PM na USP, etc., são os que ficam indignadíssimos com esse “Estado autoritário, que está cerceamento o direito fundamental a se matar lentamente tragando fumaça docinha”.

Enfim: “Danem-se todos! Só não mexam na minha meia-entrada, na minha meia-passagem, na minha meia-nicotina, na minha meia-consciência.”

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