quinta-feira, 28 de agosto de 2014

PORQUE NÃO VOTAR EM MARINA SILVA

Após a lamentável e trágica morte de Eduardo Campos, o cenário político-eleitoral mudou completamente e a ameaça à Dilma e à continuidade das políticas sociais iniciadas por Lula já não é mais tanto o Aécio Neves, que teve a candidatura enfraquecida, mas sim Marina Silva.

Muita gente passou agora a ver a Marina como a representante da mudança, uma messias, a salvadora da pátria que vai livrar todos dos males do PT, do PSDB e dos outros partidos. Mas será que ela difere muito do que há de pior nesses dois partidos, sobretudo no PSDB? É como se, caso eleita, a corrupção fosse acabar no Brasil. Marina é o maior engodo político dos últimos tempos, uma candidatura insossa mas que virou o “canto da sereia”, que não resiste a uma análise crítica um pouco mais aprofundada.

Na verdade, inicialmente, ver Marina crescer foi positivo, porque Aécio ficava ainda mais longe de ser eleito, o que é, em si, uma vitória tremenda para o país. Contudo, pesquisando um pouco sobre quem é realmente Marina Silva e quais são as suas intenções no governo, percebe-se que, na verdade, do ponto de vista econômico e social, ambos não se diferenciam em quase nada. Pode-se dizer que Marina é, hoje, um Aécio mais esverdeado. 

Marina foi do PT durante mais de uma década, depois foi para o PV e, por fim, tentou fundar um novo partido, mas não conseguiu por falta de apoio e assinaturas necessárias. O partido que ela queria formar era “sem ideologia”, “nem de esquerda, nem de direita”, voltado especialmente para quem “está cansado de política”, na mesma esteira do sucesso eleitoral de Tiririca. Aliás, o último Presidente que vendia essa ideia foi Collor. Mais fácil que politizar as pessoas para decidirem conscientemente é desqualificar toda a política e, fingindo estar fora do jogo, fazer o povo de idiota. Luiza Erundina, companheira atual de partido de Marina, disse que ela “emburrece o debate político”, e é isso mesmo que está acontecendo. Afinal, alguém viu alguma proposta de Marina? Ela limita-se a falar que é “a cara da mudança”, que vai fazer a “nova política”, mas proposta que é bom, nada. Ou alguém sabe efetivamente o que ela vai fazer pela educação, saúde, segurança, saneamento,  infra-estrutura, transporte e demais questões sociais?

No “quem dá mais” político, para não ficar fora da disputa presidencial, Marina filiou-se a um partido qualquer, o PSB de Eduardo Campos, com o qual não tem nenhuma afinidade. Desde a sua entrada no partido para concorrer como vice, entrou em atrito constantemente. Agora, o próprio partido não sabe mais o que fazer com ela, que pegou para si a legenda, desvirtuando o programa deles. Diverge em vários pontos do próprio vice, assim como divergia de Eduardo Campos. Por exemplo, Marina antes disse que não apoiaria Geraldo Alckmin (embora seu partido apoiasse), agora diz que espera governar com o apoio de José Serra, aquele que afirmou não ver ilicitude na formação de cartéis, e seu vice atual aparece pedindo voto para Alckmin na TV. Essa é a “nova política”, baseada no velho oportunismo. Não à toa alguns já abandonaram o barco. Ela é um vazio. Não tem propostas e as que tem são altamente incoerentes entre si.

Como disseram: “Alguém que saiu do PT, saiu do PV, não conseguiu fazer o jogo político pra fundar um partido, foi aceita em uma legenda alugada mas está quebrando o pau lá dentro... Eu teria como melhor amiga. Mas tenho dificuldade em querê-la como Presidenta.” Sendo esse chamariz de conflitos, com que apoio Marina vai governar? Que nunca saibamos a resposta.

No mais, ela está garantindo a todos que vai "recrutar" os melhores para compor sua equipe, os melhores do PT, do PSDB e de outros partidos. Se ela fosse mesmo capaz de fazer isso o teria feito em seu próprio partido, que não foi fundado exatamente por falta de apoio. Vive mencionando que vai “unir todos os brasileiros”, negando veementemente a luta de classes, como antes defendia. Quer dizer, esse discurso de “grande conciliadora acima do bem e do mal” é megalomaníaco e nitidamente enganoso.

Sobre a candidatura, já pende um problema sério relacionado ao avião de Eduardo Campos ter sido comprado por empresas fantasmas, com suspeita de financiamento por caixa-dois da campanha. Ela disse no Jornal Nacional que sabia da irregularidade e que o avião teria sido emprestado, o que foi rapidamente desmentido, já que não havia empréstimo. Absurdamente, o pessoal do partido dela disse inicialmente que os documentos que comprovariam a regularidade da compra estavam dentro do avião (!).Não é o argumento perfeito para esconder qualquer coisa? A “nova política”, pelo jeito, eleva o cinismo a níveis superiores aos da “velha política”. Além disso, reportagem do Estadão mostrou que Campos, a quem Marina se aliou, enquanto era governador de Pernambuco havia favorecido o dono do helicóptero.

Para quem não se lembra, Marina fez uma gestão medíocre no Ministério do Meio Ambiente. Os dados são conflitantes, mas durante a sua gestão, ao que tudo indica, a Amazônia teve recordes sucessivos de desmatamento, o que só foi corrigido com a sua substituição pelo Ministro Carlos Minc. Falando em má-gestão, por que será que Marina ficou em terceiro lugar na última eleição presidencial justamente em seu berço eleitoral, o Acre? Quem conhece mais de perto parece não recomendar.

Sobre o fato, em si, dela ser evangélica, não há nenhum problema. Mesmo. O problema, na verdade, começa quando ela mistura política e religião, como se o estado brasileiro não fosse laico. Ela é, por exemplo, contra a união civil entre pessoas do mesmo sexo e contra estudos com células tronco, mas a favor da isenção tributária às igrejas e templos religiosos. Aliás, embora ela hoje negue, já se pronunciou favoravelmente ao ensino do criacionismo nas escolas, ao lado do evolucionismo, como se a versão bíblica da origem do mundo e da vida tivesse algum tipo de embasamento científico minimamente comparável ao da teoria darwiniana, que até o Vaticano hoje em dia aceita. Ela chegou até a defender o racista, machista e homofóbico Marco Feliciano, enquanto presidente da comissão de direitos humanos, dizendo que ele estava sendo atacado apenas por ser evangélico, num vitimismo muito bem planejado para comover os desatentos.

Em outras palavras, em relação aos costumes e às leis moralistas que temos, se alguém deseja algum avanço, pode esquecer. Ela sequer discutirá algum dia pautas progressistas como, para citar dois exemplos, a legalização da interrupção voluntária da gravidez ou da maconha ou qualquer outra droga hoje proibida. O cargo político mais importante do País não pode ser ocupado por alguém que coloca a sua convicção religiosa pessoal acima do interesse público.

Ainda: é muito difícil dar voto a quem, pouco depois da morte de seu companheiro de chapa, afirma que foi salva por “providência divina”... Meio estranho a providência não ter simplesmente salvado Eduardo Campos e ela da morte, e não apenas ela. Apesar de entender a ambigüidade da declaração, contar com a providência divina não é um perfil especialmente adequado para um Chefe de Estado e de Governo. E quem acompanha o noticiário sabe que ela não perde a oportunidade de aproveitar-se da morte de seu companheiro como isca de voto. 

Como se não bastasse, reiteradas vezes ela já mencionou que é a favor a legislar sobre direitos humanos via plebiscito. Isso seria um completo desastre do ponto de vista da proteção às minorias e aos desassistidos. No Brasil, infelizmente, pouquíssima gente sabe o que são realmente os direitos humanos, seguramente a maior conquista da humanidade de todos os tempos, qual a sua origem e importância para a paz social. Levar isso a consulta popular é jogar os tudo isso no lixo, porque a noção que as pessoas têm sobre esses direitos é aquela fascista trazida pela grande mídia, de que "direitos humanos só protege bandido".  Uma candidata que nega dessa maneira os direitos humanos e a dignidade humana não merece o voto de ninguém. Interessante é que ela não quer fazer consulta popular a respeito da isenção de impostos para igrejas...

Recentemente ela disse que pretende adotar a "autonomia" do Banco Central. Parece uma declaração inofensiva, mas, traduzindo, ela assumiu de vez sua ideologia NEOLIBERAL, uma vez que bancos centrais autônomos são desvinculados da política do governo, mas, em contrapartida, vinculados às vontades das grandes empresas, dos banqueiros, dos bilionários, do mercado, do capital. Ou seja, é uma autonomia em relação ao povo; mas quem decide sobre a política econômica serão as elites, às quais Marina declarou seu incondicional amor no debate da Band (além de ter dito que o Brasil precisa de mais elite e que Chico Mendes, que deve ter virado cambalhotas no túmulo, era parte da elite).

Sua coordenadora de campanha é uma herdeira e sócia do Banco Itaú, Neca Setúbal. Justo Marina, que antes dizia que bancos eram “vorazes por lucro” e “não tinham nenhum compromisso com o povo”. E precisava ser justo do Itaú, que deve R$ 18 bi (mais de 4 vezes o gasto público federal com arenas da Copa) em impostos? Que forte interesse uma banqueira tem nas eleições, senão o de garantir que seu banco vai lucrar ainda mais, às custas do trabalho do povo? Como alguém escreveu, os jovens que foram às ruas em junho de 2013 contra os bancos vão votar na candidatura do Itaú?

Para completar, ela tem em sua equipe econômica políticos neoliberais declarados, como André Lara Resende, que sugeriu ao Collor que confiscasse a poupança popular e foi ligado ao PSDB na época de FHC, tendo, inclusive, participação nas privatizações, e Eduardo Giannetti da Fonseca. Este último disse recentemente que alunos de universidades públicas devem pagar mensalidades (o que indica a sanha de privatização) e que a Unicamp é fruto da ditadura, unicamente porque a Faculdade de Economia segue, em regra, uma escola de pensamento econômico diferente do (neo)liberalismo.

Para quem não sabe, neoliberalismo econômico é a doutrina que FHC seguia, do Estado Mínimo, que resultou em desemprego, inflação alta, juros altos, leis trabalhistas e direitos previdenciários revogados, salários reduzidos, empresas falindo e formação de monopólios, privatizações desastrosas, poucos e desprezíveis programas sociais. Por isso é perfeitamente possível dizer que Marina muito pouco se diferencia de Aécio Neves nesse ponto, que na verdade talvez seja o principal a ser levado em conta numa escolha política.

Por fim, e essa questão realmente me intriga: como é possível uma candidata que pretende impedir que o Estado intervenha na economia se dizer a favor da ecologia e da tão repetida “sustentabilidade”, se apenas o Estado pode adotar políticas que impeçam as empresas de destruir e degradar o meio-ambiente? As empresas, por si mesmas, vão deixar de poluir e respeitar a natureza? Isso ela não explicou, mas "neoliberalismo ecológico" é um exemplo de contradição em termos, um paradoxo, um oxímoro. Aliás, Marina é contra os transgênicos, seu vice, é a favor, e o interlocutor direto dela com o agronegócio, João Paulo Capobianco, disse recentemente, nessas palavras: "não somos contra, nem a favor aos transgênicos". Bela posição. Pelo menos combina com o “nem direita, nem esquerda”.

Sim, “nem contra, nem a favor”, “nem direita, nem esquerda”, “nem pra trás, muito menos pra frente”, apenas o poder pelo poder, a “boa” e velha política, pintada de verde para parecer nova, mas passada de podre por dentro.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Na Moral e Feminismo

Ontem o "Na Moral" foi sobre machismo. Até que foi interessante, mas acho que deveriam escolher melhor as pessoas que vão lá defender ideias. Digo, o lado feminista estava extremamente bem representado, mas o lado contrário estava um fracasso.

Havia uma autodenominada "filósofa", contrária ao movimento feminista, dizendo que as mulheres não devem nada ao feminismo, pois, segundo ela, o próprio avanço da democracia já permite a conquista de direitos pelas mulheres. É necessário ser filósofo para ver nesse argumento um engodo?

Ora, em Atenas havia "democracia" e as mulheres passavam longe de ter alguma voz. Hoje, a democracia já avançou bastante e ainda assim as mulheres são vítimas de violência doméstica, são assediadas na rua, ganham menos que o homem, não podem se vestir como bem entendem sem serem julgadas, etc. Inclusive, basta lembrar que se deu no Canadá, uma sólida democracia, o episódio do policial que reclamou das roupas das mulheres, dizendo que elas não deveriam se vestir como vadias, gerando protestos e desencadeando a famosa Marcha das Vadias mundo afora.

Quer dizer, o próprio conceito do que seja democracia é mutável no tempo e no espaço, e a história mostra que apenas a luta organizada dos oprimidos, tal como fazem as militantes feministas, gera a conquista de direitos, o que no fundo se traduz na distribuição do poder na sociedade - poder este que, no capitalismo desregulado, tende a se concentrar exclusivamente nas mãos dos mais ricos e conservadores.

Ainda, a "filósofa" afirmou que a repercussão negativa que recai sobre as mulheres vítimas de revanche pornô (divulgação pelo ex-namorado de vídeos de sexo do casal) não tem nada a ver com machismo, pois poderia existir o caso de homem ser filmado brochando, o que seria, também, igualmente vergonhoso. Porém, na verdade essa idéia acaba confirmando a tese feminista. Ora, o homem precisa brochar para ser estigmatizado (essa supervalorização da "potência" sexual é também uma forma de machismo); já para a mulher, só o fato de ter feito sexo já é motivo de vergonha, afinal, as mulheres são criadas, conforme a Bíblia, para se tornarem donzelas, subservientes aos homens (1 Coríntios 11:3; Efésios 5:23).

Se são nessa linha os argumentos antifeministas, não há dúvidas de que o movimento feminista é, sim, de suma importância para a efetivação da igualdade entre os sexos e, por consequência, para o fortalecimento da democracia.

E convenhamos, homens: brochante mesmo é mulher antifeminista.