segunda-feira, 27 de maio de 2013

Década de 70 - Tempo de ultra-criatividade

Conhecer bandas como Secos e Molhados, Os Mutantes e Novos Baianos me faz querer muito ter vivido a década de 70, só para ver tudo acontecendo, esses caras dando a cara pra bater, pouco se lixando para o que as gravadoras queriam e sendo originalíssimos, colocando em prática de forma sublime a Antropofagia brasileira pretendida por Oswald de Andrade e seus contemporâneos já na década de 20.

Porém, penso na possibilidade de ter passado ileso a tudo aquilo, absorto ouvindo apenas os "tremendões" da Jovem Guarda alienada ou a música americana da época, que culturalmente pouco nos dizia respeito. Será?

Meu medo é que hoje eu esteja obtuso e deixando passar despercebidos, por ignorância e preguiça, artistas tão ou mais geniais que aqueles guerreiros pretéritos, até pelo fato da grande mídia só ofertar ao público artificialidades que imediatamente se transformam em vultuosas cifras.

Difícil pensar que daqui a uns 40 anos é possível que alguém inveje a oportunidade que eu estou tendo, aqui e agora, de viver exatamente tudo o que não estou vivendo.

De qualquer forma, não me canso de ouvir, além das bandas já citadas, Raul, Tom Zé, Jorge Ben, Tim Maia, Chico, Gil, Caetano, Raul, Rita Lee, Elis, Ney, Renato Teixeira, Paulinho da Viola, Gonzaguinha, enfim, toda essa gente que desbravou o caminho para tudo que temos hoje, vivendo de algum modo o espírito pulsante revolucionário daquela época, que apesar dos muitos pesares, tinha diversos encantos.

terça-feira, 14 de maio de 2013

Parabéns!


Se você acha que a sua raiva ou o seu medo não justificam uma injustiça, parabéns, você é a favor aos direitos humanos individuais.

Se você acha que o seu conforto não justifica a miséria alheia, parabéns, você é a favor aos direitos humanos sociais.

Se você acha que as cadeias estão lotadas demais e que por isso deve-se encarcerar apenas aqueles que cometem os crimes mais graves, parabéns, você é a favor do direito penal mínimo.

Se você acha que os trabalhadores devem correr atrás de melhores condições de vida por diversos meios lícitos, parabéns, você é a favor ao direito de greve.

Se você acha que o Estado deve intervir para proteger a parte mais frágil nas relações sociais, parabéns, você é tão contra o fim do direito do consumidor, dos idosos e das pessoas com deficiência quanto contra a flexibilização do Direito do Trabalho.

Se você acha que as crianças e adolescentes são pessoas em desenvolvimento, devendo ser integralmente protegidas, e que é dever do Estado garantir todas as condições para que eles sejam devidamente educados e tenham um crescimento saudável, parabéns, você concorda com o ECA e, se refletir um pouquinho mais, será contra a redução da maioridade penal.

Se você não acha nada disso, volte urgentemente a ler a sua Veja.

Juristas "pró-trabalhador"


Observando algumas colocações de determinados juristas, eu chego a concluir que ser "pró-trabalhador" é apenas uma moda, uma tendência a ser seguida para não ficar para trás, pronta para ser revertida se os ventos passarem a apontar outra direção. Como se o verdadeiro intuito de entendimentos jurídicos que protegem a parte mais frágil nas relações sociais, a elevação da condição social e humana, fizesse parte apenas da retórica, não fosse algo a ser verdadeiramente aplicado e, mesmo que aos pouquinhos, conquistado.

Preferia acreditar que essas contradições fazem parte do próprio ser humano, mas, refletindo melhor, não sei mais se é bem assim. A pensar.

Esquerdismo e doença


Um amigo muito preocupado com a minha saúde me enviou um estudo afirmando que o esquerdismo é uma doença mental.

Em um primeiro momento, achei bom que esse estudo tenha atrasado tanto, pois se essa descoberta tivesse sido feita há alguns séculos, resultando em confinamento generalizado de esquerdistas em manicômios, estaríamos presos para sempre em algum ponto da Idade Média ou, no máximo, do Absolutismo Monárquico. Certamente ainda teríamos (ou seríamos) escravos, as mulheres seriam submissas, e ainda seria plenamente aceitável a exploração do trabalho exaustivo e desumano, de crianças e adultos. Falo em causa própria, inclusive, pois antes das lutas das esquerdas os doentes mentais, como eu acabo de me descobrir, eram degredados, espancados, torturados e mortos. Ufa!

Mas em relação ao estudo em si, nenhuma surpresa. Viver em um sistema absolutamente individualista se colocando em tempo integral no lugar do outro, do invisível, do mais frágil, daquele para quem a sociedade insiste em negar a condição humana, enfim, das minorias em geral, sempre analisando criticamente as causas e consequências sociais de cada dado da realidade, só poderia mesmo ser doença.

Afinal, como se observa por aí, normal mesmo é apoiar as grandes corporações monopolistas e as políticas de concentração de renda, achar que a ditadura militar brasileira não cometeu atrocidades, acreditar que os médicos cubanos, que prestam auxílio humanitário com sucesso pelo mundo inteiro, irão concretizar uma revolução comunista por aqui e concluir que programas sociais e a legislação social geram “vagabundos” e “aproveitadores”, mesmo que os fatos demonstrem precisamente o contrário a tudo isso. Minha doença é tão grave que me impede de invejar essas mentes sadias.

Aliás, devo estar em fase terminal, pois fiquei pensando no quão positivo seria se essa doença fosse infecto-contagiosa, afinal, contaminando todas as pessoas do mundo, talvez não teríamos mais tanta exploração do homem pelo o homem, tanta dominação, miséria, violência, desigualdade e injustiça. Não é o caso, infelizmente... O modo mais comum de contraí-la é observando acuradamente a realidade, pensando, conversando, contestando, discutindo, refletindo, lendo, estudando de forma mais aprofundada as ciências humanas em seus diversos ramos.

Claro que esse estudo que meu amigo me enviou apenas maquia de pseudo-argumentos técnicos o bom e velho mantra do “se você não concorda com a minha visão de mundo, obviamente a única correta, você só pode ser louco”, tendo sido provavelmente concebido para de alguma forma responder a diversos outros trabalhos que concluem serem os esquerdistas mais inteligentes ou que afirmam ter o conservadorismo caráter patológico, os quais, por sua vez, também têm questionável credibilidade científica.

Mas em todo o caso, eu, agora um doente convicto, fiquei contente em saber que sempre que eu acordar “de esquerda” poderei obter um atestado médico e faltar do trabalho; também terei direito a prestar concurso público dentro da quota para pessoas com deficiência; por fim, poderei estacionar o carro nas vagas para deficientes e ser atendido nos caixas preferenciais, sempre ganhando tempo para gastar com as ideias que me ocorrem devido a essa assustadora doença da qual sou um portador em estágio avançado, que me faz acreditar em absurdos como a emancipação humana face a qualquer tipo de dominação e a vitória da solidariedade sobre o egoísmo.