Nossos legisladores são tão obtusamente incompetentes que talvez tenham dado de bandeja o antídoto contra a terceirização da atividade-fim.
Vejam como eles definiram o trabalho temporário:
"Trabalho temporário é aquele prestado por pessoa física contratada por uma empresa de trabalho temporário que a coloca à disposição de uma empresa tomadora de serviços, para atender à necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviços."
Agora vejam como definiram a terceirização em geral:
“Empresa prestadora de serviços a terceiros é a pessoa jurídica de direito privado destinada a prestar à contratante serviços determinados e específicos.”
Perceberam a diferença? No primeiro caso, de trabalho temporário, eles quiseram deixar claro que vale para a atividade-fim, falando em “substituição de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviço”. Agora, no segundo caso, da terceirização em geral, eles não repetiram essa expressão e nem colocaram nada parecido. Na verdade eles restringiram os serviços que podem ser terceirizados àqueles “determinados e específicos”. E o que são esses serviços determinados e específicos? Certamente não são as atividades-fim, pois se assim fosse eles teriam usado expressões pelo menos equivalente às que usaram em relação ao trabalho temporário. Mais do que isso, serviços “determinados e específicos” podem ser interpretados como várias conotações, inclusive justamente a de que são apenas as atividades-meio (“serviços determinados”) e, ainda assim, apenas algumas (“serviços específicos”). Aliás, “determinada” pode até mesmo se referir a atividades limitadas no tempo, como a reforma do estabelecimento ou uma auditoria independente.
Se vocês lerem o projeto original, de 1998, vão ver que a redação era diferente, expressamente excluindo as atividades-fim (falava-se em “fora do âmbito das suas atividades-fim e normais da tomadora”). Assim, bastaria os legisladores, para evitar qualquer dúvida, terem invertido o sinal e dito “incluindo as atividades-fim e normais da tomadora”. Mas eles não o fizeram. Preferiram, ao contrário, restringir a autorização das terceirizações apenas às nebulosas atividades “determinadas e específicas”.
Está aí a válvula de escape jurídica, a caminhar paralelamente com a luta política dos trabalhadores. Enquanto não bater no STF, acho uma boa opção de interpretação pró-empregado, em consonância total com os princípios da proteção, da interpretação mais favorável e da condição mais favorável. E isso, claro, sem nem entrar em grandes questões constitucionais e convencionais, as quais certamente já ceifariam, por si, qualquer eficácia dessa lei, mesmo que fosse bem feita.